Catiuza VIana

Quando uma colisão inesperada acontece, como você reage?

Hoje, literalmente, minha rota foi de colisão. Foi a caminho do trabalho, justo no trânsito que sempre foi um ambiente meio hostil em minhas experiências.

Uma velhinha, uma faixa de pedestres, uma pequena desatenção e a moça que vinha dirigindo atrás do meu veículo colidiu em cheio na traseira do meu carro.

Aquele barulho, avenida movimentada, ela desce até a minha janela, junta as mãos em aflição e diz: – moça você está bem? Me perdoe, pois, meu pé escorregou do freio e não consegui parar a tempo de evitar o acidente!!

Essa deve ter sido a sétima vez que batem no meu veículo, certamente creio ter sido a primeira vez que eu me senti calma. Tenho trauma de batidas porque as pessoas em geral mesmo erradas tendem a ficar gritando e meu temperamento não é de levar desaforo para casa. Tenho pavor de “motoqueiro”, pois já fui desrespeitada por um e perdi a cabeça. Mesmo ele estando todo errado, como eu cobrei dele uma definição sobre o meu prejuízo, ele para se esquivar disse que eu era muito estressada e perguntou se era falta de homem. Vocês acreditam que eu tive que ouvir tal absurdo?

Mas dessa vez foi diferente. Pela primeira vez eu me senti realmente calma. Apesar do contratempo e do horário da consulta na nutricionista, que já estava em cima da hora, mantive meu foco na situação presente, tentei não acessar as outras lembranças ruins sobre as batidas anteriores. Eu costumava me sentir desamparada nessas situações e muitas vezes me ressentia com a vida por estar sozinha ao volante e por sofrer agressões e discriminação por ser mulher.

Nas colisões anteriores fui vítima de desacatos criminosos cometidos tanto pelos exemplares masculinos estúpidos que conduziam o outro veículo, quanto pelos maridos das dondocas que chegavam tocando o terror na cena do acidente. Quando não tocavam o terror comigo, tocavam o terror com as esposas. Uma vez eu precisei intervir e pedir ao marido descontrolado para ter calma com a esposa e afirmar que acidentes acontecem.

Voltando a cena da colisão atual, a moça estava nervosa, parecia ter sido sua primeira colisão. Ela pegou o celular tremendo, constrangida e assustada, disse: – vou ligar para o meu esposo, pois ele quem resolve essas coisas.

Em outros tempos eu confesso a vocês que isso por si só me afetaria muito, tanto quanto o idiota que me perguntou sobre a falta de homem, pois afinal, o príncipe dela iria chegar em instantes para salvá-la e eu não tinha o mesmo recurso conjugal para utilizar no momento. Em outros tempos aquela dependência dela me irritaria, mas tenho tentado me tornar uma pessoa melhor, respeitando às diferenças e a história de cada um, já que entendo que os tempos e os níveis de experiência são individuais e cada um age do seu jeito.

Tentei ser paciente, emprestei meu telefone e ela fez a ligação, pois acabara de ficar sem créditos. Não alterei a voz, não gritei, em tempos passados facilmente poderia ter sido impulsiva, mal educada ou no mínimo sarcástica, já que ela foi a culpada pelo transtorno.

Como o marido estava um pouco distante sugeri a ela retirarmos os carros para o acostamento e graças a deus ambos os veículos ainda estavam funcionando. Já que o esposo dela ia demorar, resolvi ir à consulta, estava há uma quadra do consultório, e assim eu fiz.

Quando retornei até o local o marido dela estava lá, tinha acabado de chegar. Tão perdido quanto a esposa, vinha acompanhado do seu pai. Era um casal jovem, inexperiente com sinistros, não possuíam seguro e o carro havia sido comprado a pouco tempo; estavam claramente começando a construir a vida deles.

Acionei, então, a minha corretora de seguros que mandou um funcionário ao local para prender o meu para-choque e permitir que me locomovesse com o veículo até as oficinas. Eu e minha corretora demos toda uma consultoria do que fazer, como resolver, quais as opções disponíveis e as questões legais e administrativas relativas ao acidente, bem como sobre o acionamento do seguro. Tudo se resolveu com diálogo, respeito e proatividade.

Fiquei muito orgulhosa de mim hoje! Foi uma superação a minha reação. A princípio eu quis ligar para alguém, até pensei em uma figura masculina para me ajudar, confesso que é automático ainda em mim. Depois que tudo passou fiquei pensando quantas coisas deixamos de aprender porque nos dizem que é coisa de homem. Quer saber? Eu não ligo mais de virar o garrafão de água no bebedouro. Agora tenho uma nova meta! Vou aprender a trocar pneu! Eu sempre resisti porque achava o cúmulo uma mulher fazer isso, mas é bobagem, só machismo meu, tenho que admitir.

As colisões inesperadas deixam seus aprendizados. Se da primeira vez você não teve a melhor postura, aprenda e tente melhorar da próxima vez que algo te pegar de surpresa. O que acontece não é o que importa, mas como você reage!

Agora estou esperando o carro sair da oficina. Recebi uma ligação do esposo da moça me agradecendo pela paciência e confirmando o pagamento da franquia. Assim, gentileza gerou gentileza. Foi uma linda experiência!