Catiuza VIana

O que faz falta realmente te faz bem?

Amadurecer é abrir mão de fantasiar ou negar os seus próprios fantasmas. Encarar as suas sombras e a realidade do próprio desamparo, é reconhecer que todos somos, na verdade, seres individuais. É assim que chegamos ao mundo, sozinhos. Somos seres únicos, destinados a viver individualmente nossas próprias jornadas. Não é incomum que em alguns momentos nesse processo a gente perca as próprias referências, na dualidade de ser só (indivíduo) e ao mesmo tempo um ser social (sujeito coletivo), que se constrói a partir das suas próprias experiências de interação com o outro.

Vale salientar que ninguém se basta em tudo, plenamente ninguém vive sozinho ou isolado o tempo todo, sem considerar o outro, mesmo que sejamos distintos dele. Podemos até gostar de viver sozinhos, mas a interação humana é quase inevitável quando estamos organizados e inseridos em uma sociedade.

O irônico e ao mesmo tempo desafiador é perceber que ainda que essas jornadas sejam individuais, nós nos construímos enquanto sujeitos e firmamos nossa identidade através do convívio e das relações sociais com outros humanos, tão únicos quanto nós. É a coexistência do EU e do OUTRO em interação com o universo que nos forma, nos molda. Assim, transformamos a realidade ao nosso redor tanto quanto somos transformados por ela.

Todos nós, em maior ou menor proporção, lidamos com algum vazio, com alguma falta durante nossas jornadas. Muitas vezes sequer conseguimos nomear o que julgamos ser um sentimento, uma sensação, e confundimos solidão com incompletude. Alguns desses vazios podem ser expressados pela falta do amor tão idealizado e ainda não vivido, para outros pode ser o sucesso financeiro ainda não alcançado, uma carreira profissional ainda não consolidada, a falta de amor dos pais ou dos filhos, e, assim, para cada ser único, o vazio se confunde com a falta e se materializa em alguma realidade ou fantasia.

Dessa forma, você pode ter o casamento dos sonhos, muito prestígio profissional, sucesso financeiro, um parceiro sexual incrível, mas ainda assim padecer no vazio da falta dos filhos que ainda não foram gerados, por exemplo. Muita gente está casada, mas nunca se sente amada o suficiente. Outros padecem no vazio de suas próprias crenças, por não acreditarem em nada transcendente ou maior do que si mesmo, logo, podem padecer no vazio de suas próprias convicções. Quem perde entes queridos também lida com essa falta. Todos nós em alguma área da vida lidamos de maneira pessoal com esse tema.

O que fazemos com essa falta, vazio ou incompletude, como queira chamar, é que faz a diferença. O modo como você admite a verdade que apesar de sermos individuais não somos necessariamente completos em tudo, existindo, portanto, uma natureza humanamente faltosa em nós, é que nos faz olhar nossas mazelas sobre novos pontos de vista.

Não confunda o conceito de vazio existencial no sentido filosófico do termo com carência afetiva. Todos lidamos com situações onde a falta e o vazio se apresentam, mas se você o nomear por carência não vai conseguir suprir suas faltas. No máximo viverá escravo de comportamentos compulsivos, já que algo da essência humana sempre vai habitar em você e nunca poderá ser totalmente eliminado.

A charada é o que fazemos com essa não saciedade, pois a esperança humana pode ser milagrosa, doentia e desastrosa. Não é semântica exagerada, é a pura verdade. Nossa sociedade inclusive prega a esperança de um mundo mais altruísta. Em termos morais existe uma certa EGOFOBIA, do ponto de vista do que é dito como politicamente correto. O altruísmo é supervalorizado, uma imagem mais adequada socialmente falando.

Ninguém quer ser taxado de egoísta, porém, mesmo sendo o altruísmo o ideal dos mundos profetizados, ouso aqui afirmar que ninguém é tão altruísta ou generoso que não seja movido por algo de seu próprio interesse, mesmo que seja o desejo de reconhecimento, que pode ser inclusive inconsciente. Nem todo altruísmo é virtuoso, como dizia o rei Salomão no livro de Eclesiastes: “Vaidade, tudo é vaidade” … foi o que o sábio concluiu ao final da vida. Afinal, porque você defende certas causas e outras não, porque cada um sabe a causa que lhe serve.

Por isso concluo que o altruísmo e o egoísmo coexistem em nós! Por vezes estamos egoisticamente centrados em nossas faltas e dores e em outros momentos estamos tentando ajudar o outro em seus dias ruins, mas algo sempre nos move e nada é neutro de motivações pessoais. Desse modo, o maior altruísta seja talvez o maior egoísta se acreditar que não precisa de nada nem de ninguém. Talvez a maior lição nem seja se doar, mas seja aprender a receber, pois, demonstrar fragilidade, pedir ajuda, reconhecer seus próprios erros e dificuldades, é para poucos.

Mas voltando ao nosso título, será que tudo que você sente falta na tua vida realmente te fazia bem quando fazia parte do seu passado?

É muito bom quando nós descobrimos que estamos sofrendo por padrões disfuncionais porque nos dá a chance de sermos mais felizes e menos controversos ao nos livramos deles.

Por exemplo, seu relacionamento abusivo que acabou não te faz falta. É no máximo carência que pode ser tratada se assim você se permitir. O emprego que se foi, suas perdas financeiras podem ter trazido obstáculos até você, mas a carga de estresse e assédio que você sabe que sofria não faz falta. Reconheça os ciclos, converse com seus vazios. É difícil se reconhecer como um adulto carente ou mimado, mas pode ser sua salvação admitir.

Por outro lado, preciso dizer que as fases de plenitude e calmaria existem e virão, portanto, não as menospreze. A noção de plenitude mesmo que não seja constante nos ensina muito sobre como reconhecer quando estamos faltosos conosco e com os outros. Logo, só entende de vazio quem em algum momento já se sentiu pleno e saudável, cheio de potência e criatividade.

Seja essa energia vibratória e em movimento, não se prenda nem sinta mais falta de nada que de algum modo não te fazia bem e você nem percebia de tão dependente que estava! Siga em frente na luta por bem-estar e saúde emocional! É sua jornada, portanto, não se abandone no processo do caminhar!

Afinal, nem tudo o que te faz falta te faz bem!